Postagem em destaque

Linguagem: quando é preciso consultar um fonoaudiólogo?

Especialistas explicam quais sinais indicam atrasos na fala A maior parte das crianças começa a falar por volta dos 12 meses....

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Relações entre processos cognitivos e lingüísticos: terapia fonoaudiológica para adolescente surdo, dentro de uma visão sócio-antropológica


FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

1. Considerações Gerais sobre Surdez

1. Importância da Audição

Ouvir é uma importante fonte de experiências sociais. É muito provável que nenhuma incapacidade produza tantas dificuldades específicas em relação à comunicação e à linguagem, do que a deficiência da audição.
Aprende-se a falar, a compreender a fala dos outros, a comunicar experiências passadas e idéias; assim, falamos para ação futura, porque podemos ouvir.
Desse modo, a audição e a fala são extremamente importantes e contribuem, decisivamente, para a aceitação social do indivíduo, ou seja, para que o mesmo usufrua de um sentimento de segurança pessoal, auxiliando-o, de maneira preponderante na aprendizagem.
Conseqüentemente, a perda da audição, além de fazer com que os sons da vida permaneçam desconhecidos para o indivíduo, impede-o de dominar a língua falada pelos seus pais, seus irmãos e pelos seus compatriotas.
Assim, é principalmente através da audição que o indivíduo adquire a linguagem, a característica mais marcante ao ser humano. Não ter acesso à linguagem significa não conseguir desenvolver em toda a sua plenitude uma capacidade lingüística; significa também perder o direito de se tornar pessoa, em toda a abrangência da palavra.
Nas pessoas surdas, o estabelecimento de um sistema lingüístico deverá partir do processamento das informações visuais-verbais, pois só desta forma, elas poderão acessar a simbolização e os conceitos.

2. O que é Surdez?

Significa a incapacidade de ouvir e de entender a fala, ou seja, a audição socialmente incapacitante. O surdo não pode ouvir sons com freqüências na escala da fala humana. O ouvido humano percebe normalmente os sons com 20 a 20 mil vibrações por segundo. Dessa maneira, o surdo pode ouvir certos sons, embora não possa ouvir a fala. As crianças surdas aprendem a falar com muita dificuldade. Normalmente as crianças aprendem a falar imitando a fala dos outros. Mas as crianças surdas não podem ouvir a fala, portanto, nunca aprendem a falar o bastante para serem entendidas. Para se comunicarem com os outros, usam a linguagem de sinais e outras técnicas especiais. Muitos surdos conseguem fazer até o curso universitário e exercer profissões variadas. A surdez não é impedimento à ampla variedade de ocupações.
As conseqüências da surdez são as mais variadas possíveis e dependem de distintos fatores: grau da perda auditiva; época do surgimento da mesma; inteligência; experiências vivenciadas nos primeiros anos de vida, educação precoce e oportunidade de estarem em contato com outros surdos, o que é fundamental para o processo de identificação e, conseqüentemente, para o desenvolvimento de uma personalidade harmoniosa.

3. Histórico da Educação dos Surdos

Desde os tempos antigos, haviam pessoas que nasciam surdas. Essas não conseguiam falar normalmente, passando a expressar-se por sinais. Durante toda a antigüidade e quase toda a Idade Média, consideraram-se os surdos como ineducáveis. Desde esta época, havia referências acerca da utilização de sinais por parte dos surdos; entretanto, só no final do século XVIII se contou com uma descrição destes sinais como parte integrante de um código lingüístico.
No Renascimento, houve uma nova concepção da surdez, isto é, não se negou ao surdo sua humanidade, pelo contrário, se lhe atribuiu esse potencial humano. Conseqüentemente, procurou-se de todas as maneiras instruir o surdo para que ele pudesse desenvolver suas potencialidades. Os surdos passaram a se comunicar na língua de sinais, expressando suas idéias por meio da língua escrita. Na época renascentista, os surdos gozaram de oportunidades que, posteriormente, lhe foram negadas, com imposição do oralismo, a partir da segunda metade do século passado.
O século XIX foi testemunha da luta entre duas tendências conflitivas, o oralismo e o gestualismo, na educação do surdo. Já nas primeiras décadas, o método francês do abade Charles Michel de L´Epée, que foi fundador da primeira escola de surdo, alcançou conquistas significativas, entretanto aos êxitos iniciais do gestualismo sucedeu uma poderosa reação do oralismo, que a partir da segunda metade do século passado foi ganhando terreno em todos os setores. Até o século XIX, a surdez foi considerada acima de tudo em termos sociais e pedagógicos, porém a partir de certo momento passou a ser vista em termos médicos. Esta medicalização da surdez irá acarretar uma série de efeitos negativos para a comunidade surda. Esse processo culmina com o Congresso de Milão, a partir do qual as estratégias educacionais para os surdos, tornaram-se terapêuticas.
Nos Estados Unidos, no século XIX, a educação do surdo teve aspectos originais e peculiares na sua evolução, graças a Thomas Hopkins Gallaudet (1787-1851) e seus sucessores surdos e ouvintes, mesmo em condições adversas garantiram espaço para a comunidade surda subsistir, preservando sua cultura e sua identidade. Nos Estados Unidos, a figura mais destacada do oralismo foi Alexander Graham Bell.
Resumindo, podemos afirmar que, historicamente, a sociedade negou ao surdo a possibilidade de ele lutar pelos seus direitos, tendo inclusive uma atitude paternalista em relação à sua educação. Eram poucas as pesquisas dedicadas a este segmento social, e os estudos realizados concebiam a surdez, exclusivamente como um tipo de patologia audiológica. Só a partir de 1960, com base nos esforços de Stokoe e outros é que se desenvolveu uma verdadeira neuropsicologia da surdez; conseqüentemente começou a se compreender como o surdo aprende e a importância da Língua de Sinais, como um instrumento propriamente lingüístico.

3.1. A Educação do Surdo no Brasil

Iniciou em 1857, no Rio de Janeiro a 1ª escola para educação dos surdos pelo professor francês surdo Ernest Huet. Os alunos foram educados por linguagem escrita, datilológica e de sinais. No Brasil, como no resto do mundo, a caminhada foi a mesma; oralismo, comunicação total, e recentemente o bilingüismo e biculturalismo, resultante de uma visão muito mais abrangente do que a visão médica, a visão sócio-antropológica da surdez.
A realidade brasileira é muito diferente da realidade de outros países e faz muito pouco tempo que a visão sócio-antropológica da surdez passou a ser discutida academicamente. Certamente ainda vamos enfrentar muitos desafios, antes de termos uma proposta brasileira sobre o bilingüismo que permita aos profissionais um bom trabalho e às pessoas surdas melhores condições de aprendizado, de participação e, sobretudo, que respeite mais o contexto individual e cultural desta comunidade.

2. Introdução à Anatomia e Fisiologia da Audição

A audição é um sentido muito importante no desenvolvimento e manutenção do funcionamento normal do ser humano. A aquisição e monitoramento da fala, a detecção de perigo potencial, a sensação de existir um universo vivo dependem da audição. O ouvido nos permite perceber os sons. Além disso, nos dá o sentido de equilíbrio. A capacidade de ouvir nos permite trocar idéias e opiniões com outras pessoas através da fala. Assim, a audição está intimamente relacionada ao desenvolvimento fonético do indivíduo, tanto na aprendizagem quanto na modulação e no controle de sua voz através da audição.

1. Anatomia do Ouvido

O ouvido está em sua maior parte contido no osso temporal e em íntimas relações com o aparelho vestibular ou do equilíbrio. A parte visível do ouvido é apenas uma porção desse órgão vital, o qual se estende profundamente pelo crânio. O ouvido consiste em três partes, cada qual com distintas características estruturais e funcionais: o ouvido externo, o ouvido médio e o ouvido interno.
Ouvido externo: O ouvido externo é constituído pelo pavilhão auricular ou orelha, pelo conduto auditivo externo com suas porções óssea e cartilaginosa e pela membrana timpânica. O pavilhão auricular se encontra na parte de trás da articulação temporo mandibular e região parotídea e pela frente da apófise mastóidea do osso temporal. É constituído por um esqueleto fibrocartilaginoso coberto por pele e sua face externa apresenta relevos e depressões. Sua função é coletar as ondas sonoras e afunilá-las para o conduto auditivo externo.
O conduto auditivo externo é continuação do orifício auditivo externo. Situa-se entre a membrana timpânica e o pavilhão auricular. É uma formação tubular revestida pela pele e possui um trajeto sinuoso. Em seu limite interno está fechado pela membrana timpânica. Tem como função principal conduzir o som até a membrana timpânica. Serve também para estabelecer comunicação entre o mecanismo auditivo (ouvido médio) e o meio externo. Compõe-se de duas partes: uma externa sobre um esqueleto cartilaginoso e uma interna cujo esqueleto é ósseo.
A membrana timpânica encontra-se na porção final do conduto auditivo externo, separando-o do ouvido médio. É uma estrutura delgada, côncava e semi transparente; e está fixada à parede do conduto auditivo externo por um anel de tecido fibroso chamado anel timpânico.
Ouvido médio: O ouvido médio ou cavidade timpânica é um sistema de cavidades ocas, preenchidas de ar, que se comunicam entre si, encontrando-se integrado à estrutura óssea do osso temporal. Esse sistema está coberto por mucosa e sua coloração é cinza rosada.
O ouvido médio tem uma função de extrema importância na transmissão do fluxo de energia aérea, oriunda do ouvido externo para os líquidos do ouvido interno sem que exista perda ou alteração nas suas características físicas. Apresenta seis paredes paralelas entre si: parede lateral- membrana timpânica; parede posterior- nervo facial, músculo estapédio, antro da mastóide; parede medial - janela oval, janela redonda e promontório; parede anterior - tuba auditiva e semicanal do músculo tensor do tímpano; parede inferior - células timpânicas, bulbo da veia jugular e artéria carótida interna e parede superior - tegmen tympani.
O ouvido médio é composto por três estruturas principais: caixa timpânica e ossículos, sistema pneumático do osso temporal e trompa de eustáquio.
Caixa timpânica: é uma cavidade óssea, situada entre o conduto auditivo externo e o ouvido interno. Tem como função transmitir o som desde o ouvido externo até o ouvido interno. Sustenta a cadeia de ossículos que coloca a membrana timpânica em contato com a janela oval, que é a entrada do ouvido interno. Dentro da caixa timpânica, encontra-se a cadeia de ossículos formada pelo martelo, pela bigorna e pelo estribo.
Sistema pneumático do osso temporal: é composto de células da mastóide, arejadas, comunicadas entre si e cobertas por mucosa. Com freqüência, invadem a zona posterior e inferior da caixa timpânica, que está integrada na apófise da mastóide. Há também células da mastóide que se dirigem para as zonas internas do osso temporal, ultrapassando as estruturas do ouvido interno. A mucosa que recobre este sistema, possui células secretoras de muco e células ciliadas que deslocam o muco para o assoalho da caixa timpânica. O assoalho da caixa timpânica se liga com a terceira estrutura do ouvido médio, a trompa de eustáquio.
Trompa de eustáquio: é o conduto que liga o ouvido médio com a porção superior da faringe ou rinofaringe. Tem a função de equilibrar a pressão negativa que se forma no ouvido médio com a pressão da rinofaringe. A trompa é a via de drenagem das secreções produzidas pela mucosa do ouvido médio em estado patológico. Na estrutura da trompa, encontramos duas partes: uma porção óssea e uma porção cartilaginosa. A trompa em repouso se encontra colabada pela tensão elástica da cartilagem e dos tecidos peritubários. Sua abertura se dá de modo ativo junto à contração da musculatura do véu do palato, ao se realizar deglutição ou um bocejo.
Ouvido interno: O ouvido interno está contido na porção petrosa do osso temporal e situa-se por dentro e por detrás da caixa timpânica. É a parte mais dura do ouvido. Também é denominado de labirinto e é formado por duas porções: uma anterior - cóclea (órgão de corti) e outra posterior - aparelho vestibular (canais semicirculares), utrículo e sáculo.
A cóclea transforma o estímulo mecânico em elétrico. E o aparelho vestibular dá função de equilíbrio. Entre ambas porções há uma zona chamada vestíbulo.
O ouvido interno possui três tipos de estruturas: labirinto ósseo, labirinto membranoso e líquidos labirínticos.
Labirinto ósseo: contém o labirinto membranoso e os líquidos labirínticos. Dentro desse labirinto estão: a cóclea, os canais semicirculares e o vestíbulo ósseo. A cóclea se situa diante do vestíbulo. Sua base relaciona-se com o fundo do meato acústico interno e um ápice que é o promontório. Possui três elementos: columela- pirâmide, ocupa o eixo da cóclea; canal espiral - tubo ósseo e lâmina espiral - lâmina óssea. Os canais semicirculares estão atrás e acima do vestíbulo. Fazem o equilíbrio dinâmico. E o vestíbulo ósseo situa-se entre a cóclea e os canais semicirculares. Na face externa estão a janela oval e a janela redonda; na face interna temos o fundo do meato acústico interno e a passagem aos ramos do nervo vestibular.
Labirinto membranoso: é formado por estruturas de membrana, em cujas cavidades circulam os líquidos labirínticos. Dentro desse labirinto estão: o ducto coclear, o órgão de corti, o ducto semicircular e o vestíbulo membranoso. O ducto coclear é uma formação membranosa, no interior do canal espiral da cóclea. É por onde vem a perilinfa. A lâmina espiral e o ducto coclear juntos dividem o canal espiral em duas rampas: uma anterior que é a vestibular e uma posterior que é a timpânica. Quando elas se encontram, chamamos de helicotrema. O ducto coclear tem um aspecto triangular e possui três faces: anterior - membrana de Reissner, posterior - membrana basilar e externa - ligamento espiral. O órgão de corti fica sobre a membrana basal. Possui células de sustentação que sustentam as células ciliadas que podem ser interna (uma fileira) ou externa (três fileiras). As células ciliadas externas tem função de proteção e amplificação, as internas dão o impulso elétrico. O ducto semicircular situa-se no interior do canal semicircular, formando o conjunto de células de sustentação e de célula ciliada. No vestíbulo membranoso temos células ciliadas e a mácula. As primeiras responsáveis pela posição da cabeça e pelo equilíbrio estático e a mácula responsável pela orientação direcional.
Líquidos labirínticos: são perilinfa e endolinfa. A perilinfa circula por um circuito que se encontra entre o labirinto ósseo e o labirinto membranoso. E a endolinfa o faz entre as cavidades internas do labirinto membranoso.

2. Fisiologia da Audição

A audição é uma sensação fundamental à vida, pois é a base da comunicação humana. O órgão responsável pela audição é o ouvido, o qual se encontra localizado no osso temporal e divide-se em ouvido externo, ouvido médio e ouvido interno. A parte mais importante é o ouvido interno, pois sua porção anterior, a cóclea, abriga o órgão de corti, que é uma estrutura mecano-receptora essencial à audição. O ouvido possibilita que as ondas sonoras excitem as células sensoriais de corti com o mínimo de perda energética.
O ouvido externo tem função de canalizar as ondas acústicas para a membrana timpânica. Quando o fluxo de energia sonora incide sobre a membrana timpânica, faz com que esta vibre com o mesmo padrão de vibração do estímulo sonoro. Parte da energia que a atinge é refletida devido aos fatores de resistência, de forma que a intensidade do estímulo sonoro é diminuída. Com a saída da membrana timpânica de sua posição de equilíbrio, ocorre movimentação da cadeia ossicular que está ligada a ela pelo cabo do martelo.
O ouvido médio, possui uma função de acoplar dois meios com impedâncias diferentes, o ar e os líquidos labirínticos. Adapta essas duas impedâncias, atuando como transformador da pressão acústica. O martelo e a bigorna movem-se, transmitindo ao estribo um movimento de pistão dentro da janela oval, movimentando assim, os líquidos labirínticos. Para esses líquidos se moverem, é preciso que haja uma outra estrutura que compense os movimentos da janela oval. Essa estrutura é a janela redonda que comunica a rampa timpânica com o ouvido médio.
No ouvido interno, os movimentos da janela oval, serão transmitidos à rampa vestibular e, conseqüentemente, à membrana de Reissner. Esses se transformarão em movimentos da endolinfa e, posteriormente, da membrana tectória sobre as células sensoriais do órgão de corti. Esse movimento da membrana tectória sobre os cílios sensoriais é o que ocasionará o impulso nervoso, isto é, transformará a energia mecânica em energia bioelétrica.

3. Classificação das Perdas Auditivas

Segundo Russo e Santos (1993), as perdas auditivas podem ser classificadas levando em consideração os seguintes fatores: momento em que ocorrem, tipos de perdas auditivas e classificação quanto ao grau de perda auditiva.

1. Classificação das Perdas Auditivas Quanto ao Momento em que Ocorrem

  • Pré-natal: se ocorre durante a vida gestacional;
  • Peri-natal: se ocorre durante o nascimento;
  • Pós-natal: se ocorre após o nascimento.



2. Tipos de Perda Auditiva

As perdas auditivas podem ser divididas em: condutivas, neurossensoriais, mistas, centrais e funcionais.
Quando os testes revelam uma perda da sensibilidade auditiva através da condução aérea e os limiares da condução óssea são normais, a perda auditiva é condutiva. Resulta de patologias que atingem o ouvido externo e/ou médio, diminuindo a quantidade de energia sonora a ser transmitida para o ouvido interno. A perda auditiva condutiva pode ser identificada pela discrepância entre os limiares da condução aérea e óssea. A perda da acuidade auditiva quase nunca é superior a 60 dB. Na perda condutiva, a deficiência é uma diminuição da intensidade, já que o ouvido interno é normal e o problema reside nas porções externa ou média do mecanismo da audição. O problema reside na "condução" do som para o ouvido interno.
Quando uma perda auditiva é encontrada tanto na condução aérea quanto na óssea e os limiares da condução óssea encontram-se no mesmo nível dos limiares da condução aérea, a perda é neurossensorial. Resulta de distúrbios que comprometem a cóclea ou o nervo coclear VIII. Os ouvidos externo e médio apresentam-se normais. O problema é com a "percepção" do som no ouvido interno ou mais adiante. O indivíduo tem dificuldades com a clareza, além de uma redução de intensidade.
O tipo misto de perda é uma combinação do tipo condutivo e do neurossensorial de perda. Há uma perda da audição tanto pela condução aérea quanto pela óssea, mas a perda pela condução óssea não é tão grande quanto a pela condução aérea, havendo a produção de uma "lacuna aérea-óssea" em algumas freqüências de teste. Os limiares da condução óssea mostram a presença de perda neurossensorial mas, já que os limiares da condução aérea estão piores, há também um componente auditivo na perda auditiva.
A perda auditiva central atinge a via auditiva central, ou seja, a porção do nervo coclear e de suas conexões que se encontram entre o núcleo coclear e o córtex do lobo temporal.
São denominados portadores de perdas auditivas funcionais aqueles pacientes cujo comportamento auditivo não está de acordo com os limiares tonais apresentados.

3. Classificação das Perdas Auditivas Quanto ao Grau

Segundo DAVIS & SILVERMANN apud RUSSO e SANTOS (1993), as perdas auditivas podem ser classificadas quanto ao grau em:
  • Normal: de 0 a 25 dB
  • Leve: de 26 a 40 dB
  • Moderada: de 41 a 70 dB
  • Severa: de 71 a 90 dB
  • Profunda: de 90 dB em diante



4. Fatores Etiológicos Relacionados ao Caso

1. Citomegalovírus

O citomegalovírus, pertence ao grupo herpesvírus. A infecção por citomegalovírus pode persistir por toda a vida do indivíduo sob forma latente, podendo reativar-se anos após, quando as defesas imunológicas estiverem comprometidas.
A transmissão de citomegalovírus pode dar-se das seguintes formas: Gestacional (geralmente por via transplacentária), Perinatal (provavelmente por contato com secreções cervicais) e Pós-natal (ocorre por contato com secreções como saliva, sêmem, leite humano, urina ou por transfusão de hemoderivados e transplantes como de órgãos, medula óssea infectados pelo citomegalovírus).
O citomegalovírus é considerado atualmente a causa mais comum de infecção congênita no homem. Estima-se que 10% dos recém-nascidos infectados apresentam sintomas ao nascer. Entre as principais seqüelas observadas após infecção congênita pelo citomegalovírus, destacamos deficiências auditivas, variando de deficiência parcial unilateral a surdez bilateral profunda. A deficiência auditiva é suficientemente importante para provocar sérias dificuldades de comunicação verbal e fala em mais de um terço dos casos e, em 80% dos casos, a deficiência auditiva desenvolve-se ou acentua-se após o primeiro ano de vida.

2. Rubéola

A rubéola também conhecida como Sarampo Alemão, é uma infecção viral, contagiosa, benigna, mas quando ocorre numa gestante pode levar à infecção fetal crônica grave e a malformações. Fora da gravidez parece uma gripe forte acompanhada de vermelhidão que começa no tórax e depois se estende por todo corpo.
A transmissão da doença se dá por via respiratória das pessoas doentes, principalmente durante a fase de vermelhidão. O problema aparece quando a rubéola acomete uma mulher grávida ainda não imune à doença.
Na maioria dos casos, durante os três primeiros meses, a rubéola leva ao abortamento. Se isso não acontecer, o feto poderá ter problemas de audição e visão, alterações cardíacas e problemas nervosos. Durante o segundo trimestre, um dos principais problemas causados ao feto é a surdez , pois justamente no período embrionário em que o ouvido está em desenvolvimento, o vírus da Rubéola Fetal inibe a multiplicação das células, aumentando as fragmentações cromossômicas responsáveis por anomalias e malformações. Geralmente, o comprometimento situa-se no ouvido interno, resultando em perdas neurossensoriais moderadas, severas e até profundas, dependendo do período gestacional da infecção; pode ser observado também um retardo psicomotor. Nos últimos três meses de gestação, a doença não tem efeito sobre o bebê.
A rubéola pode ser prevenida através de vacina. Toda mulher em idade reprodutiva deve ser vacinada antes de engravidar, assim o bebê não correrá nenhum risco.

3. Toxoplasmose

É um processo infeccioso, determinado pelo protozoário toxoplasma gondi. A transmissão da infecção ao feto é infreqüente no primeiro trimestre (5%), mas muito grave, sendo que neste período pode até gerar surdez. No último trimestre é comum (67%), mas sem maior gravidade.
O homem adquire a infecção principalmente por três vias: a ingestão de cistos do solo, areia, latas de lixo e em qualquer local onde os gatos defecam em torno de casas e jardins, dissiminando-se através de hospedeiros transportadores, tais como moscas, baratas e minhocas; ingestão de cistos de carne crua e mal cozida, especialmente porco e carneiro e infecção transplacentária mostrou que cerca de 40% dos fetos foram infectados por essa via em mulheres que contraem a infecção toxoplásmica durante a gravidez.
A doença é usualmente pouco importante em adultos, podendo passar despercebida. No entanto, quando a mãe desenvolve a infecção durante a gestação, ela pode transmitir a doença para o feto, o qual é bastante sensível ao protozoário.
Por outro lado, alguns recém-nascidos infectados são assintomáticos, mas podem vir a desenvolver complicações da doença se não forem tratadas.
O tratamento é feito com medicações que combatem o protozoário. Embora esse procedimento não reverta as lesões já instaladas, o tratamento seguramente impede a progressão dessa doença e reduz o número e a gravidade das seqüelas, razão pela qual é sempre administrado esse tipo de medicação nos casos diagnosticados.

5. AASI - Indicação e Aspectos Atuais

6. Indicação de Aparelho de Amplificação Sonora Individual (AASI)

A total integração do ser humano ao mundo ocorre no momento em que esta estabelece comunicação com o seu meio.
Dentre as formas conhecidas, a linguagem oral é a mais usada, visto que expressa de forma mais rápida e completa o que se quer transmitir. Por tal motivo, a audição assumiu um papel de grande importância, e o indivíduo que de alguma forma se vê privado deste sentido tem o seu principal meio comunicativo prejudicado.
O objetivo básico deste trabalho consiste em apresentar e analisar alguns aspectos básicos na indicação de um dos meios que visa à integração de pessoas portadoras de deficiência auditiva não tratáveis medicamentosa ou cirurgicamente, o AASI.

1. Histórico

Por volta de 1900 despontaram os primeiros aparelhos formados por um microfone de carbono, uma bateria e um fone de ouvido. Tratava-se de um aparelho bem maior do que os atuais, sem meios para controle de amplificação.
Mais tarde, por volta de 1938 foi criado o aparelho com tubo a vácuo, visando uma maior amplificação. Também neste, o incômodo residia no tamanho, pois necessitava de duas baterias.
Pós II guerra mundial, em meados de 1950, os circuitos receberam maior sofisticação com o advento do transistor. Tal fato trouxe grandes vantagens à performance do AASI como uma significativa miniaturização a conseqüente mudança no funcionamento elétrico, ocasionando diminuição do consumo de energia e, portanto, uma redução em suas dimensões.
A partir daí, com o avanço da tecnologia foram criados novos modelos esteticamente mais bem aceitos (retroauricular, intra canal, intra auricular) e com novas possibilidades de controles visando uma melhor razão sinal-ruído. Tais modelos perduraram por muitos anos até chegarmos à microeletrônica digital que nos proporciona, nos dias de hoje, uma maior versatilidade na programação de um AASI.

2. O Aparelho Auditivo

Um AASI é essencialmente um amplificador que tem como função captar a energia sonora do ambiente, acrescê-la de uma potência pré determinada e direcioná-la ao ouvido do usuário de forma a levar a informação acústica mais próxima a seu nível de melhor discriminação e melhor conforto.
Todo aparelho é composto basicamente por: microfone, sistema de amplificação e receptor que se dispõe da seguinte forma:
A - Microfone - Trata-se de um transdutor mecanoelétrico encarregado de transformar a energia acústica que capta, em energia potencial elétrica, para percorrer os circuitos elétricos de cada segmento do AASI. Os microfones tiveram muita variação desde os primórdios até os usados atualmente. A evolução ocorreu em termos de durabilidade e qualidade do sinal transformado. Os aparelhos atuais têm um microfone ELECTRET que é responsável por gerar um campo magnético e, da variação deste campo, ocorre a vibração do diafragma que é enviada ao pré-amplificador.
Dentro das variações de um microfone contamos com dois tipos de captação da energia sonora:
....A1 - Microfone multidirecional - teoricamente tem capacidade para perceber o som incidente de até 360º.
....A2 - Microfone direcional - tem capacidade de captação seletiva, percebendo o som de até 180º de incidência.
B - Pré amplificador - A tensão da corrente emitida pelo micro é menor do que a capacidade de percepção do amplificador. Portanto, torna-se necessário um estágio de pré-amplificação, visando aumentar esta tensão para que o amplificador principal a perceba.
C - Amplificador - É o estágio onde acontece o maior número de modificações do sinal de entrada, ou melhor, é nele que ocorre modificação na quantidade de energia do sinal, da faixa de freqüência e das demais características acústicas básicas da onda sonora. Atuam em um amplificador a maior parte dos controles existentes no AASI (H cut, L cut, out put, gain, etc.).
D - Bateria - Todo circuito do AASI consome energia que é fornecida por baterias que são atualmente de dois tipos: mercúrio ou zinc-air. A durabilidade depende de fatores variáveis tais como potência do aparelho, ruído ambiental e uso de bobina telefônica.
E - Receptor - A energia elétrica transformada pelo microfone e amplificada agora está no estágio final: o receptor. Neste ocorre a transdução novamente para energia acústica para que possa ser entendida pelo usuário.

3. Tipos de AASI

A - Tipo caixa ou convencional - É o mais antigo dos aparelhos utilizados hoje em dia, mas que ainda, pela distância entre microfone e receptor consegue prover maior amplificação. Pela sua estrutura é o mais resistente, sendo indicado nos casos de crianças portadoras de perdas profundas com pouco ou nenhum resto de audição e para pacientes com problemas motores sérios. Há ainda a possibilidade de adaptação pseudo binaural, onde com um aparelho podemos estimular os dois ouvidos. Como desvantagem, podemos citar a falta de estética como a principal, uma vez que é significativo o número de pacientes que colocam esse fator como empecilho. Outra desvantagem reside no fato do microfone situar-se em posição não anatômica, pois os mesmos estão colocados na parte superior da caixa que fica localizada no nível do osso esterno.
Tipos de adaptação caixa:
....A1 - Binaural - aqui são usados dois aparelhos de caixa; cada qual com um fio simples (fio I). Ficam situados um em cada lado do peito.
....A2 - Monoaural - adaptação feita para estimular apenas um ouvido com um aparelho e um fio I. Fica situado no centro do peito.
....A3 - Pseudo binaural - neste tipo de adaptação é usado um aparelho para a estimulação dos dois ouvidos através de fios Y ou V.
.... ....A. Aparelho retroauricular - Foi o que nos últimos tempos teve sua gama de uso extremamente aumentada com modelos criados para todos os tipos de perda incluindo severas e profundas. Neste o microfone está situado em posição mais anatômica trazendo a amplificação mais próxima do natural, em relação ao de caixa. É também esteticamente mais aceitável devido ao seu tamanho reduzido. Com este tipo de AASI podemos também contar com mais um recurso para a melhora das características acústicas fornecidas por ele: o molde.
.... ....B. Aparelhos embutidos em haste de óculos - Trata-se de um aparelho retroauricular embutido na haste do óculos. Foi muito usado há tempos atrás em casos de deficiência auditiva e visual associados porém esta associação acabou sendo um obstáculo a esta adaptação, uma vez que, quando retirado o óculos, o paciente voltava a sentir dificuldade em enxergar e escutar. O fator estético também influenciou muito para a sua não aceitação pois as hastes devem ser grossas a fim de sustentar todo o circuito. Ele pode ser usado com molde auricular, levando a amplificação por via aérea ao paciente; ou com vibrador ósseo incorporado à haste do óculos, em casos onde há gap aéreo-ósseo. Como este segundo exigia determinada compressão na mastóide foi caindo em desuso devido ao desconforto.
.... ....C. Aparelho intra auricular e intracanal - São os mais requisitados pelos pacientes hoje, pois trazem grandes benefícios no que concerne à parte estética à qual se dá muita importância. Algumas são as vantagens deste tipo de uso e, entre elas, a posição anatômica do microfone (a nível do CAE), permitindo com que o som seja percebido de forma mais equivalente à real. No caso do intracanal, há também a preservação da função da concha do pavilhão auricular na amplificação. Cabe salientar também que há uma restrição dada pelo tamanho deste tipo de AASI. Pacientes portadores de problemas motores e sensibilidade diminuída do tato não se adaptam a esse tipo de aparelho. Mesmo assim, nos últimos anos tem crescido a sua preferência em todo mundo, principalmente devido ao avanço dos circuitos que estão possibilitando o aumento da utilização deste para o maior número e tipos de perdas auditivas.

7. Concepções Ideológicas e suas Implicações Clínicas e Educativas

Apesar das inúmeras investigações, que já não deixam dúvidas a respeito da verdade científica em relação à Língua de Sinais e da importância dos processos identificatórios do surdo com sua comunidade, as relações de poder entre os dois saberes (o saber da surdez e o saber construído acerca dos surdos) ainda continuam intactas. Esta situação não permite que o novo discurso seja legítimo e amplamente aceito.
A cultura ouvinte é a dominante, conseqüentemente as técnicas e as decisões são na sua maioria, propostas pelos ouvintes. O ideal é que os surdos possam ter oportunidade de ter uma educação em que exista realmente paridade entre ambas as línguas.

1. Oralismo

O oralismo visa à integração do surdo na comunidade de ouvintes, dando-lhe condições de desenvolver a língua oral. A noção de linguagem, para esta filosofia, restringe-se à língua oral, e esta deve ser a única forma de comunicação dos surdos.
Seu objetivo é fazer com que o surdo faça parte da sociedade ouvinte através da fala e de boa leitura orofacial, evitando a utilização de sinais.
O oralismo percebe a surdez como uma deficiência que deve ser minimizada pela estimulação auditiva. Esta estimulação possibilitaria a aprendizagem da língua portuguesa e levaria a criança surda a integrar-se na comunidade ouvinte e a desenvolver uma personalidade idêntica à dos indivíduos ouvintes.
A educação oral começa no lar e, portanto, necessita da participação efetiva da família. O oralismo sempre foi e continua sendo uma experiência que apresenta resultados nada atraentes para o desenvolvimento da linguagem e da comunidade dos surdos. Críticos desta abordagem, argumentam que canalizar todas as experiências pedagógicas e sociais da criança surda pelo recurso mais fraco, a competência oral, produzia fracassos em lugar de sucessos. O surdo não é visto dentro de suas possibilidades e de suas diferenças, mas no que lhe falta e que deve ser corrigido de qualquer forma para que ele possa integrar-se e ser "normal".
Segundo Mindel e Vernon (1970), o oralismo força as pessoas surdas a se adaptarem a uma imagem do que as pessoas ouvintes pensam que elas deveriam ser. Todas essas tentativas de oralização do surdo buscam a transformação desta num ouvinte que jamais poderá vir a ser. Uma vez que ele não pode vir a ser, nem a se comportar, nem a aprender da mesma forma que o ouvinte, as abordagens oralistas não alcançaram o resultado desejado (desenvolvimento e integração do surdo na comunidade ouvinte).
O princípio educacional não estava baseado na necessidade do surdo e numa compreensão de suas necessidades, ou sequer em sua forma de comunicação. Isto não quer dizer que muitos surdos trabalhados no oralismo não tenham conseguido desenvolver um nível de linguagem e de fala bastante inteligível. O problema é que estes são poucos e a questão de integração na comunidade ouvinte, ainda continua existindo. A surdez nunca é anulada, tanto pelos profissionais como pelos ouvintes e, infelizmente, o surdo continua sendo estigmatizado pela sociedade ouvinte.

2. Comunicação Total

Na década de 60, a insatisfação com os resultados da linha oralista era muito grande nos EUA. Pesquisas e novos conhecimentos teóricos levaram a questionar o trabalho realizado até aquele momento, pois este não levava ao desenvolvimento esperado de fala, leitura orofacial, desenvolvimento de linguagem e habilidades de leitura.
A comunicação total foi considerada como filosofia que incorpora as formas de comunicação auditivas, manuais e orais apropriadas para assegurar uma comunicação efetiva com as pessoas surdas (Schindler, 1988). Preocupa-se, principalmente, com os processos comunicativos entre surdos e surdos e surdos e ouvintes. Acredita também que os aspectos cognitivos, emocionais e sociais não devem ser menosprezados em prol do aprendizado exclusivo da língua oral. Por isso essa filosofia defende o uso de recursos espaço-visuais como facilitadores da comunicação. Fornece, portanto, uma comunicação fácil, livre, de dois caminhos entre a criança surda e o seu ambiente mais próximo (Northern e Downs, 1975). A idéia consiste na utilização de alguma maneira que transmita vocabulário, linguagem e conceitos de idéias entre o falante e a criança surda.
A comunicação total acredita que apenas o aprendizado da língua oral não propicie um pleno desenvolvimento à criança surda.
Brill (1977), sugeriu que sejam estimuladas todas as formas possíveis de comunicação, tendo por objetivo o desenvolvimento cognitivo e da linguagem.
Outra característica importante é o fato desta filosofia valorizar a família da criança surda, acreditando que cabe à família o papel de compartilhar seus valores e significados, formando junto com a criança, pela comunicação, sua subjetividade.
No Brasil, além da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), a comunicação total usa a datilologia (alfabeto manual), o "cued- speech" (sinais manuais que representam os sons do português), o português sinalizado (língua artificial que utiliza o léxico da língua de sinais como a estrutura sintática do português e alguns sinais inventados, para representar estruturas gramaticais do português que não existem na língua de sinais) e o pidgin (simplificação da gramática de duas línguas em contato). Por exemplo, português e língua de sinais no Brasil.
A comunicação total não privilegia o fato de esta língua ser natural e levar junto uma cultura própria, então cria recursos artificiais para facilitar a comunicação e educação dos surdos, que podem provocar uma dificuldade de comunicação entre surdos que dominam códigos diferentes e língua de sinais.

3. Bilingüismo

O bilingüismo tem como idéia básica que o surdo deve ser bilíngüe, ou seja, deve ter como língua materna a língua de sinais, que é considerada a língua natural dos surdos e, como segunda língua, a língua oficial de seu país.
A língua de sinais propiciará ao indivíduo uma base para a aprendizagem de uma segunda língua, a qual pode ser escrita ou oral, dependendo do modelo seguido. Isto é, a criança é exposta à Língua de Sinais por interlocutores surdos, ou ouvintes que tenham proficiência em Língua de Sinais. A língua oral ou escrita será trabalhada seguindo os princípios de aprendizado de uma segunda língua. Assim, as línguas de sinais são tanto o objetivo como o facilitador do aprendizado em geral. São ainda, línguas naturais e de modalidade gestual-visual e, como tal, apresentam especificidades próprias devido às restrições de ordem estrutural e a fatores sócio- culturais. Além da função comunicativa, as línguas naturais têm outra importante função que é a de suporte lingüístico para a estruturação do pensamento.
Os surdos apresentam um impedimento de ordem sensorial na percepção das distinções fonêmicas da fala, que prejudica a compreensão dos significados. Em vista disso, criou-se a necessidade de um outro "meio" para a realização de suas potencialidades lingüísticas.
O princípio fundamental do bilingüismo é oferecer à criança um ambiente lingüístico, no qual seus interlocutores se comuniquem com ela de uma forma natural, da mesma forma como é feito com a criança ouvinte através da língua oral. Assim, a criança não apenas terá assegurada a aquisição e o desenvolvimento da linguagem, como a integração de um autoconceito positivo.
Segundo os bilingüistas, o surdo não precisa ter uma vida semelhante ao do ouvinte, podendo aceitar e assumir a sua surdez.
O conceito mais importante desta filosofia é que os surdos formam uma comunidade, com cultura e língua próprias. A noção de que o surdo deve aprender, de qualquer forma, a modalidade oral da língua para poder se aproximar ao máximo do padrão de normalidade é rejeitada por esta filosofia. Isto não quer dizer que a aprendizagem da língua oral não seja importante para o surdo, ao contrário, este aprendizado é desejado, mas não é visto como o único objetivo educacional do surdo, ou sequer como uma possibilidade de reduzir as diferenças causadas pela surdez.
A proposta do bilingüismo é educacional, social e cultural, independente do modo como se concebe a segunda língua a ser adquirida pelo surdo.
O sistema social, que a escola bilíngüe dá à criança surda, lhe fornece uma chance de se ver a partir da "semelhança de" e não da "impossibilidade de ser". A linguagem e a sociabilização são elementos importantes para que a formação inicial de sua identidade seja possível, e elas devem estar acessíveis à criança surda, para que a mesma tenha instrumentos para, posteriormente, adaptar-se a um mundo, que não será tolerante com seu estigma.
Esta filosofia desempenha uma importante função de suporte do pensamento e de estimulador do desenvolvimento cognitivo e social.
Rocha - Coutinho (1986) diz: Um deficiente auditivo não pode adquirir uma língua falada como língua nativa, visto que ele não tem acesso a um sistema de monitoria que lhe forneça um feedback constante para a sua fala. O deficiente auditivo conta somente com expressões faciais e movimentos corporais e não possui uma das fontes mais rica de língua oral: monitorar sua própria fala e elaborar sutilezas pela entonação, volume de voz e hesitação.
A presença de surdos adultos apresenta grandes vantagens dentro da proposta bilíngüe. Primeiro, a criança tão logo tenha entrado na escola, é recebida por um membro que pertença à sua comunidade cultural, social e lingüística; assim ela começa a ter oportunidade de criar a sua própria identidade. Segundo, essa criança começa a adquirir a sua língua natural. Tais vantagens são importantes para o sucesso da proposta bilíngüe.
Assim, o bilingüismo seria o mais apropriado às necessidades da pessoa surda, cuja potencialidade se habilita a um desenvolvimento pleno da linguagem, contanto que haja "input". Desse modo, os dados lingüísticos que lhe servirão de "input" serão transmitidos através de um canal gestual-visual, a Língua de Sinais, já que sua audição está danificada.

8. Relações Familiares

O trabalho de orientação e de aconselhamento aos pais ou responsáveis pela criança deficiente auditiva é fundamental e decisivo para o sucesso de uma proposta educacional ou terapêutica.
Segundo Bevilacqua (1985), a família é o "agente modificador da realidade" das crianças e os terapeutas funcionam como "agentes de apoio".
É importante que as pessoas relacionadas com a criança deficiente auditiva tenham conhecimento da área, persistência e entusiasmo.
A ausência de respostas auditivas que o profissional espera da criança, a lentidão do processo de desenvolvimento em razão de reduções, em qualidade e quantidade, para a construção da linguagem oral, a confusão emocional dos pais, todos esses fatores contribuirão para dificultar o acesso da criança a uma necessária interação auditiva, lingüística e social.
Segundo Cole (1992), quando os pais descobrem a deficiência auditiva da criança torna-se rodeado de conflitos, sendo assim, um momento muito delicado. Os sentimentos mais observados nos pais, ao saberem da deficiência auditiva são: negação, vulnerabilidade, ódio, confusão e inadequação e destacam que esses sentimentos passam por quatro estágios: negação, resistência, afirmação e aceitação.
É comum aos pais o sentimento de culpa pela deficiência auditiva dos filhos. A culpa gera neles uma superproteção e uma dedicação exclusiva ao filho deficiente em comparação aos demais membros da família, o que pode gerar problemas familiares. Os irmãos sofrem com o tumulto da família e tentam atrair a atenção dos pais.
A superproteção faz com que a criança não obtenha experiência em seu processo evolutivo. Fica inseguro consigo mesmo e torna-se um adulto dependente.
Segundo Bevilacqua (1985), cabe à mãe proporcionar o equilíbrio e a harmonia, estando atenta às necessidades específicas do filho, sem deixar de ter uma relação normal de mãe e filho.
Os irmãos merecem uma atenção especial, uma vez que é comum se sentirem com culpa pela sua normalidade, ou por terem raiva pelo problema do irmão. Também sentem ciúmes em relação à atenção especial que essa deficiência requer dos pais e medo de assumir a responsabilidade pelo irmão. Os pais devem incluir os irmãos nas atividades que realizam com as crianças, mostrando-lhes o quanto podem auxiliar na rotina diária e buscar o fortalecimento de sua auto-estima.
A comunicação se estabelece e desenvolve-se principalmente entre a família e a criança, pois a troca entre pais e filhos ocorre em todos os momentos da vida de ambos. Quem transfere grande parte das informações de mundo para as crianças são os pais, pois convivem com a criança desde o nascimento até a adolescência, vida profissional e adulta.
A criança deficiente auditiva encontra dificuldades no desenvolvimento do seu comportamento social, pois elas não escutam o tom de voz que indica a variação dos estados emocionais.
Ser social, é o indivíduo que, na companhia de outros, identifica os seus interesses com os demais, que tem um desejo intenso de estabelecer e de colaborar com os seus semelhantes.
A socialização do surdo com demais surdos é uma ponte para a ampliação de seu campo de interação social, possibilitando mais facilmente, a sua integração à comunidade como um todo e não apenas ao segmento representado pelos ouvintes.
As línguas gestuais-visuais são a única modalidade de língua que permite aos surdos desenvolver o seu potencial lingüístico e cognitivo, oferecendo-lhes uma possibilidade de libertação do real concreto e de socialização que não apresentaria defasagem em relação àquela dos ouvintes. São o meio mais eficiente de integração social do surdo.
A relação entre pais ouvintes e filhos surdos é um aspecto de muita complexidade, pois a criança surda não tem condições de assimilar a língua de seus pais espontaneamente. Além deste aspecto lingüístico, que por si só acarreta grandes prejuízos ao desenvolvimento da pessoa surda, há o aspecto social e cultural, pois o ser humano necessita conviver e se identificar com os seus semelhantes. Sendo o surdo um indivíduo bicultural, pertencente à comunidade surda e à ouvinte é necessário que tenha acesso às duas línguas, a oral e a língua de sinais, pois só assim se alcançará o desenvolvimento pleno do surdo como ser bicultural.

9. Cognição, Linguagem e Aprendizagem

Estudar a cognição humana, os poderes mentais do ser humano é um tema que tem chamado atenção de profissionais de diferentes áreas do conhecimento. Psicólogos, pedagogos, lingüístas, fonoaudiólogos junto com cientistas da computação não só tem estudado o raciocínio, a fala, o diálogo e a aprendizagem, como vêem tentando construir máquinas que possam raciocinar, falar, conversar e aprender, com a finalidade de poder analisar as relações da cognição, linguagem e aprendizagem.
Nosso objetivo é esclarecer e refletir estas questões no estudo da surdez. Claro que seria muito difícil em pouco tempo fazer um histórico das teorias passadas e atuais sobre as habilidades cognitivas do surdo, entretanto tentaremos sintetizar alguns aspectos relevantes e tecer considerações sobre as implicações deste tema na educação do surdo.
Com base em estudos de Vygotsky, Piaget e Bruner, pesquisadores da atualidade Marchesi (1987), Massone (1993), Stokoe (1960), Volterra (1981) desenvolveram investigações que demonstraram que pessoas deficientes auditivas apresentam capacidade cognitiva equivalente à dos ouvintes e, que são pessoas absolutamente normais, sob o ponto de vista psicológico. Mas devido à falta de informação, é comum que sejam tratados ou confundidos com deficientes mentais ou autistas. Infelizmente as pessoas surdas são marginalizadas, segregadas, tornando-se muitas vezes deprimidas e inseguras, pela incapacidade da sociedade em lhes dar atenção e respeito.
A comunicação humana é diferente e muito superior a qualquer outra comunicação conhecida. O homem se exprime através da fala, estrutura seu pensamento, comunica-se com os outros, traduz o que sente e o que quer através da linguagem. É a linguagem que marca o ingresso do homem na cultura, construindo-o como sujeito e capaz de produzir transformações.
As pessoas portadoras de deficiência auditiva apresentam dificuldades no uso da linguagem oral e sérias deficiências no que se refere ao domínio desta estrutura lingüística. Entretanto podem ser fluentes ao expressarem seus sentimentos e emoções mais profundos, na Língua de Sinais, que é a língua natural das pessoas surdas.
MYKLEBUST apud WOOD (1990), sugeriu que a vida cognitiva do surdo e do ouvinte eram muito diferentes. Crianças surdas sendo excluídas do mundo do som estariam mais centradas no "self" e nos efeitos de suas próprias atividades. Estes e outros achados levaram o autor a concluir que a surdez cria uma mudança de inspiração biológica na orientação do indivíduo em relação ao mundo e que as habilidades cognitivas do surdo são mais concretas e, portanto, menos abstratas do que as do ouvinte.
FURTH apud WOOD (1990), discordou desta idéia e, fundamentando-se em Piaget, defendeu que as capacidades cognitivas dos surdos são as mesmas que a das crianças ouvintes. Para este autor, a linguagem não pode ser a base para o pensamento, pois segundo Piaget o desenvolvimento cognitivo precede a compreensão lingüística. Para Furth a criança surda, mesmo em dificuldade com a linguagem, desenvolve a mesma habilidade cognitiva não-verbal que seus pares ouvintes.
As investigações de Furth nos deixaram questionamentos, já que a criança surda apesar de poder resolver os mesmos tipos de problemas lógicos e conceitos que o ouvinte, em geral há uma diferença na época em que isto acontece, chegando a ter um atraso de dois anos em relação aos ouvintes, inclusive em algumas tarefas a diferença é bem maior. A explicação de Furth é que o surdo tem um déficit experimental.
São poucas as investigações sobre a comunicação entre adultos ouvintes e crianças surdas, entretanto, há evidências que o principal problema entre a comunicação entre ouvintes e surdos é controle demasiado. SCHLESINGER e MEADOW apud TRIADÓ (1982), declararam que filhos surdos de pais ouvintes receberam mais ordens de suas mães. WOOD, GRIFFITHS and HOWARTH apud TRIADÓ (1986), demonstraram que em sala de aula também aparece claramente este "over control". Este demasiado controle por parte do adulto, resulta em pequena iniciativa na criança e pouca expressividade (seja em sinais, oral ou em ambos).
Segundo Wood, os efeitos da surdez na cognição, não são conseqüências diretas inevitáveis da condição da surdez, mas efeitos secundários que surgem do impacto da surdez na comunicação de pessoas ouvintes, que tem papel importante no desenvolvimento da criança surda.
Outro problema é a atenção dividida na comunicação com os surdos. Se desejamos dizer ou sinalizar algo para a criança ela deve desviar seu olhar do que está fazendo, para prestar atenção aos lábios ou às mãos.
Estas razões explicam os déficits de experiência ou atraso na cognição dos surdos. São muitas as implicações educacionais que resultam destes argumentos. A mais importante nos parece é que não basta estudar a surdez e seus efeitos na aprendizagem e cognição, simplesmente fazendo testes com os surdos, concordamos com David Wood, que o melhor é examinar as práticas de como as pessoas ouvintes tentam educar a criança surda, examinar a qualidade da comunicação entre adulto ouvinte e criança surda.
Sem saber quais os efeitos que a surdez causa nos pais, nos terapeutas e nos educadores não compreenderemos realmente a vida cognitiva dos surdos e qual o papel do ouvinte nesta formação.

Autora: Mila Weissbluth Frejman
CRFa 6813
Especialista em Reabilitação em Fonoaudiologia - Linguagem.
Fonte: Fonoaudiologia.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário