Em visita ao Brasil, o biólogo Alysson Muotri, da Universidade da
Califórnia, reuniu-se com o Ministro da Saúde, Alexandre Padilha, para propor a
criação de um centro de excelência para estudos do autismo. Saiba mais sobre
palestra do especialista a pais e mães
Neste sábado (29), o biólogo
Alysson Muotri, uma das maiores referências mundiais em pesquisas sobre
autismo, esteve em São Paulo,
no Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP, para falar sobre
as pesquisas que está desenvolvendo em seu centro de estudos na Universidade da
Califórnia, em San Diego
(EUA). A palestra - destinada a pais e mães e com apoio da CRESCER - contou
ainda com a professora da USP Patrícia Beltrão Braga, que está à frente de uma
pesquisa sobre autismo na Universidade, e teve abertura de Berenice Piana, cuja
lei que leva o seu nome foi sancionada em dezembro de 2012, concedendo ao
autista os direitos legais de todos os indivíduos com deficiência.
No evento, Muotri explicou como
usa a tecnologia de células-tronco para entender o funcionamento dos neurônios
de pessoas diagnosticadas com transtornos relacionados ao espectro autista.
Em seu centro de estudos, ele usa
uma técnica que transforma células de pessoas adultas em células-tronco
embrionárias, ou seja, células que ainda não são especializadas. Depois disso,
é possível fazê-las se desenvolver novamente e diferenciá-las em células
cerebrais. Como essas células tiveram origem em um indivíduo que já estava
diagnosticado com um problema, é possível simular no laboratório o funcionamento
dos neurônios daquele paciente em comparação com uma pessoa saudável.
A partir dessas comparações, o
grupo de estudo de Muotri já conseguiu identificar uma série de diferenças na
estrutura dos neurônios e como essas células respondem em conjunto (o que ajuda
a entender como funciona o cérebro desses pacientes). A maior parte das
pesquisas está sendo feita com portadores da Síndrome de Rett, que faz parte do
espectro autista.
Outra vantagem de ter essas
células em laboratório é a possibilidade de testar drogas sem precisar de
voluntários num primeiro momento. Isto é, os cientistas conseguem observar a
reação das células e de diversas moléculas que podem se transformar em remédios
eficazes. Claro que depois do teste em laboratório é necessário fazer os testes
clínicos, mas a técnica pode reduzir os custos desse processo. Por enquanto,
nenhum medicamento foi validado por meio desse procedimento, até porque ele
ainda é muito novo, mas é uma aposta dos pesquisadores.
Um grande número famílias enxerga
no pesquisador a possibilidade de encontrar a cura para seus filhos. No
entanto, durante a palestra, ele fez questão de esclarecer que ainda serão
necessárias muitas pesquisas clínicas e laboratoriais para atingir esse sonho.
Outra novidade trazida pelo
biólogo é que, como nos Estados Unidos já há grupos de estudo voltados para o
autismo há quase uma década, também está sendo possível fazer pesquisas
avaliando o histórico dos pacientes. A partir daí, há cientistas que buscam entender
qual a diferença entre aqueles que evoluíram bem após alguns tratamentos e
aqueles que quase não apresentaram melhoras.
Incentivo para a pesquisa nacional
A vinda de Muotri ao Brasil, no
entanto, teve ainda outro objetivo. Na última quinta-feira (27), o cientista se
reuniu com o Ministro da Saúde, Alexandre Padilha, e alguns representantes da
sociedade civil para propor a criação de um centro de excelência para estudos
do autismo. O projeto surgiu por conta de seu interesse nessa área e do contato
com pais brasileiros e pesquisadores.
A proposta é que o governo
federal invista inicialmente 100 milhões de dólares para a criação de um centro
onde seja possível realizar pesquisas, ensaios clínicos e testar possbilidades
de tratamento. Segundo Muotri, o Brasil tem a possibilidade de sair à frente
nessa área. Aqui já estão sendo desenvolvidos projetos em consonância com sua
linha de pesquisa, como o Fada do Dente, coordenado pela professora da USP
Patrícia Beltrão Braga, uma iniciativa inédita na América Latina.
O governo ainda não deu nenhum
sinal de que colocará o projeto em prática, mas a conversa desta semana pode
ter sido o pontapé inicial para uma nova realidade das pesquisas sobre o
transtorno do espectro autista no país. Sobre cura ainda é difícil falar, mas
como bem disse Muotri durante a palestra, citando Bill Gates: “Sempre
superestimamos as mudanças que vão acontecer nos próximos dois anos e
subestimamos as mudanças que acontecerão nos próximos dez. Não se deixe
adormecer pela inércia.”
Por Marcela Bourroul
Fonte: Revista Crescer
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